coringa

terça-feira, 5 de julho de 2011

A número 5





    O pai deu uma bola de presente ao filho. Lembrando o prazer que sentira ao ganhar a sua primeira bola do pai. Uma número 5 sem tento oficial de couro.
    Agora não era mais de couro, era de plástico. Mas era uma bola.
    O garoto agradeceu, desembrulhou a bola e disse "Legal!". Ou o que os garotos dizem hoje em dia quando gostam do presente ou não querem magoar o velho. Depois começou a girar a bola, à procura de alguma coisa.
- Como e que liga? - perguntou.
- Como, como é que liga? Não se liga.
    O garoto procurou dentro do papel de embrulho. - Não tem manual de instrução?  O pai começou a desanimar e a pensar que os tempos são outros.Que os tempos são decididamente outros.
- Não precisa manual de instrução.
- O que é que ela faz?
- Ela não faz nada. Você é que faz coisas com ela.
- O quê?
- Controla, chuta...
- Ah, então é uma bola.
- Claro que é uma bola.
- Uma bola, bola. Uma bola mesmo.
- Você pensou que fosse o quê?
- Nada, não.
     O garoto agradeceu, disse "Legal" de novo, e dali a pouco o pai o encontrou na frente da tevê, com a bola nova do lado, manejando os controles de um videogame. Algo chamado Monster Baú, em que times de monstrinhos
disputavam a posse de uma bola em forma de blip eletrônico na tela ao mesmo tempo que tentavam se destruir mutuamente.
     O garoto era bom no jogo. Tinha coordenação e raciocínio rápido. Estava ganhando da máquina.
     O pai pegou a bola nova e ensaiou algumas embaixadas. Conseguiu
equilibrar a bola no peito do pé, como antigamente, e chamou o garoto.
- Filho, olha.
    O garoto disse "Legal" mas não desviou os olhos da tela. O pai segurou a bola com as mãos e a cheirou, tentando recapturar mentalmente o cheiro de couro. A bola cheirava a nada. Talvez um manual de instrução fosse uma boa idéia, pensou. Mas em inglês, para a garotada se interessar.

   Luis Fernando Ver!ssimo

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Não diga nada sem pensar antes




DIZEMOS MILHARES e milhares de palavras todos os dias sem pensar no que estamos falando. Sem sacar a origem delas. Nada melhor, quando não se tem o que fazer, do que ficar buscando a origem de algumas delas. Por exemplo:
Coitado: e aquelas mães que vivem dizendo: "coitadinho do meu filho..." Será que elas têm noção que um sujeito coitado é porque levou um coito? Por isso que hoje em dia fala-se muito: coitado do Brasil.
Avacalhar: se você vive dizendo esta palavra é porque as coisas estão mais para vacas que para seres humanos, o que é uma grande avacalhação com quem quer que seja.

Forró: esta expressão tem várias origens. A melhor delas é que a palavra teria surgido durante a ocupação de Natal pelos americanos durante a Segunda Guerra. Às vezes os oficiais ianques davam festa e todos eram convidados. Era uma festa for all. Com o tempo...

Abruptamente: é você fazer algo com muita brutalidade. Cuidado.

Bandido: eram aquelas pessoas maldosas que andavam em bando, saqueando, assaltando.

Bandeira: era o dístico, o distintivo destes bandos, destas cidades, daqueles países.

Soldado: pessoa convocada para a guerra mediante o recebimento de um soldo.

Salário: na Roma antiga, muitos pagamentos eram feitos com saquinho de sal, daí o salário. Não me perguntem o que os romanos faziam com tanto sal.

Agarrar: pode parecer coisa da Idade Média, pois agarrar é exatamente meter as garras em algo. Se você não tem garras, nunca use este verbo.

Embarque: quando surgiu esta palavra, queria significar entrar no barco para partir. Hoje usa-se a mesma palavra para se entrar nos carros e, o mais estranho ainda - para se entrar num avião. O que nos leva a crer que o avião também é uma embarcação.

Livro: a palavra vem do latim libero (livre). Portanto, o livro deve ser sempre algo livre, sem censuras.

Criado-mudo: claro, é aquele móvel que está ali ao lado da sua cama para Ihe servir, para
você colocar coisas nele. E ele é ótimo, pois não fala.

Crônica: deve vir de cronos: tempo, relógio, periodicidade.

Escrivaninha: claro, é o lugar onde se sentavam os escrivães antigamente. Isso me lembra uma história que aconteceu com um meu pai. Eu andava com a mania de dizer tudo no diminutivo. Meu pai, preocupado com minha masculinidade , foi logo proibindo-o de dizer qualquer palavra que fosse no diminutivo. Um dia ele foi levar a escrivaninha que estava no reparo. Eu fui  logo dizendo:

— Mãe, o pai está aí com a escrivana.
E tem mais, muito mais palavras . Solte a sua imaginação, e deixe de minhocar.

O cavaleiro e seus moinhos de vento



Picasso

D. QUIXOTE


Assim à aldeia volta o da "triste figura"
Ao tardo caminhar do Rocinante lento:
No arcaboiço dobrado _ um grande desalento,
No entrestecido olhar _ uns laivos de loucura...

Sonhos, a glória, o amor, a alcantilada altura
Do ideal e da Fé, tudo isto num momento
A rolar, a rolar, num desmoronamento,
Entre os risos boçais do Bacharel e o Cura.
Mas, certo, ó D. Quixote, ainda foi clemente

Contigo a sorte, ao pôr nesse teu cérebro oco
O brilho da Ilusão do espírito doente;
Porque há cousa pior: é o ir-se a pouco e pouco
Perdendo, qual perdeste, um ideal ardente
E ardentes ilusões _ e não se ficar louco!

[1890]  Euclides da Cunha

Pessoas prepotentes, como você reage?

A lista de Schindeler




   Na última vez  que  li  uma   matéria  escrita por  um  político prepotente eu me anojei. Tem gente que consegue me tirar do sério. ou melhor, conseguia. Haverá poucas coisas na vida que me irritem tanto como a prepotência! É mesmo um traço de personalidade que sempre esteve na minha lista negra. Aquele arzinho sobranceiro e o sorrizito sarcástico que normalmente acompanham o prepotente são de acabar com a paciência a um santo. Ora eu, de santo não tenho nada. Pior é que parece que ele e outros cada vez vão abundando mais.
   O maior problema da prepotência é que ela parte de um princípio absolutamente improvável: o possuidor da prepotência é mais apto, melhor, mais inteligente, mais capacitado, mais conhecedor de toda e qualquer matéria que possa vir a ser abordada do que todos os outros seres humanos. São gênero de sobre-espécie.
   Muitos prepotentes conseguem inclusive ser "mais" e "melhores" em várias áreas simultaneamente, o que é uma façanha na verdade extraordinária...São verdadeiros “vips”.
   Um dos postulados mais básicos da filosofia diz que quanto mais se sabe, melhor se sabe que nada se sabe ou, para evitar esta repetição meio confusa, quanto mais conhecimento se adquire mais aprendemos que ainda temos muito mais para aprender. Mas para apreender isto é necessário ser humilde e a prepotência não se coaduna com a humildade.
   Também me tenho percebido ao longo do tempo de uma outra característica da prepotência que é tão ou mais danosa do que essa mania do "sabe tudo": os prepotentes acreditam que são infalíveis. Eles nunca erram. Ou então, se erram, nunca é culpa deles.  E obs. NUNCA pedem desculpas. É isso, isso mesmo.

   Quando é um político mal “ amado”  ou uma pessoa que não se gosta ?  Faz o que ?!   Ignora-se , pois  na  realidade  são uns  infelizes ,  preocupados  somente  em reunirem-se  transformando-se  em  vezeira  e  nada mais.                                                                            
    Há gente que pisa, há gente que humilha, há gente que pensa que é eterna. E usa a prepotência como grande arma. Maldita prepotência! Que fere, que machuca, que maltrata. Imagine! Se os arrogantes e prepotentes fossem eternos? Que bom! Não são.

                           Humberto Lauro Ramos.